terça-feira, 29 de maio de 2018

A História da Pobreza – Socialismo e movimentos trabalhistas – por Ravallion (7)


Antes de deixarmos o século XIX, não poderíamos nos esquecer do surgimento do pensamento socialista, linha de pensamento que teria repercussões duradouras. O socialismo, que emergiu como resposta à pobreza e como protesto contra a indiferença das classes mais ricas, também deu suporte aos diversos movimentos trabalhistas vindouros. O catalisador da eclosão do movimento socialista foi a rápida industrialização urbana e as péssimas condições dos trabalhadores à época da revolução industrial.

Como escola principal de pensamento socialista, o Marxismo defendia que o Capitalismo era a causa da pobreza. Segundo Karl Marx (1818-1883), a pobreza resultava da exploração do trabalho pela produção dos capitalistas, que visavam avidamente mais e mais lucros. A produção dos capitalistas geravam excedentes que eram reinvestidos levando à acumulação de capital e riqueza, enquanto que a classe trabalhadora, pobre demais, não conseguia realizar qualquer poupança, situação que agravava a desigualdade no século XIX.

Foto: Karl Marx

A partir das ideias de David Ricardo (1772-1823), Marx desenvolveu a teoria do valor-trabalho – teoria que trata da distribuição do produto entre a renda da terra, os salários dos trabalhadores e os lucros capitalistas – passando a atribuir ao trabalho assalariado todo o valor da produção capitalista. Para Marx, os salários pagos aos trabalhadores em níveis de subsistência existiam não porque eram resultado do equilíbrio do mercado de trabalho afetado pelo crescimento populacional defendido assim pelos economistas clássicos, mas porque eram determinados por normas sociais dominantes, que deveriam ser combatidas por organizações trabalhistas fortes, sem as quais a “reserva de desempregados” continuaria a ser um impedimento para a obtenção de melhores salários. Deste modo, Marx rejeitava o fato de a pobreza ser um estado natural, mas antes afirmava que era um resultado do contexto social à época.

Quando se analisa o Marxismo em termos de contribuição para as políticas públicas, Ravallion (2016) identifica uma visão ambígua. A solução marxista para a pobreza era o Comunismo, que em seu radicalismo rejeitava a distribuição paliativa proporcionada pelo Capitalismo, que inclusive atrapalharia e adiaria as defendidas transformações revolucionárias. Assim, o Estado não era visto no seu papel redistributivo tendo em vista a aplacar a pobreza. Apesar dessas ambiguidades, o Manisfesto Comunista (1848) de Karl Marx e Friedrich Engels são tomados hoje em dia como sustentação teórica para muitas medidas políticas e econômicas de combate à pobreza, tais como imposto de renda progressivo e a educação pública gratuita.

Confrontando a teoria do valor-trabalho de Marx elaborada em O Capital (1867), Leon Walras apresentou o modelo de equilíbrio geral competitivo (1874), que se tornou a linha de pensamento hegemônica na economia e baluarte teórico para o Capitalismo. No entanto, o equilíbrio walrasiano não contemplou as forças históricas, sociais e políticas que influenciavam a economia, tal como Marx o fez.

As organizações políticas socialistas e os movimentos trabalhistas na Europa e nos Estados Unidos promoveram uma série de políticas públicas progressistas já nos últimos anos do século XIX por duas razões. A primeira é que os setores conservadores, por medo de instabilidades social e política ou até mesmo de revoluções, começaram a defender melhorias para as classes trabalhadoras, a exemplo da introdução da previdência social por Bismarck na Alemanha nos anos de 1880 com intuito de afastar os trabalhadores dos movimentos socialistas. Já a segunda razão é que as coalizões políticas compostas por trabalhadores e pensadores socialistas iniciaram lobbies para estender a proteção às classes mais pobres. Enquanto os trabalhadores já começavam a ser atendidos por uma previdência, passou-se a defender também que o restante de toda a sociedade deveria contar com uma previdência universal e políticas de combate à pobreza.

O advento de novas teorias redistributivas junto à produção de conhecimento sobre a pobreza abriram um largo caminho para o desenvolvimento do estado de bem-estar social no século XX, sobretudo nos países ricos, assunto para o próximo post.

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