Há algum tempo, nós brasileiros somos bombardeados por notícias
antagônicas na área da educação, que nos fazem pensar que ora estamos entre os maiores
centros de conhecimento do mundo, ora permanecemos na estagnação educacional,
se não do analfabetismo, mas da falta de preparo educaciocal generalizada para
uma sociedade no século XXI.
Janeiro de 2018 nos trouxe a efusiva notícia de que o Brasil havia sido
promovido à elite da matemática mundial. O anúncio foi feito pelo IMPA
(Instituto de Matemática Pura e Aplicada) no último dia 25. A União Matemática
Internacional acabava de aprovar a entrada do pais no Grupo Cinco, o mais alto
em desenvolvimento em pesquisa matemática, composto por Alemanha, Canadá,
China, Estados Unidos, França, Israel, Itália, Japão, Reino Unido e Rússia (https://impa.br/page-noticias/brasil-e-promovido-a-elite-da-matematica-mundial/ ).
Essa decisão era não só esperada, como também merecedora para o Brasil,
haja vista o significativo progresso da pesquisa nos bons centros de estudo de
matemática pelo país, capitaneado pelo IMPA no Rio. Em 2014, o matemático
brasileiro Artur Ávila foi galardeado com a Medalha Fields, considerada o
Prêmio Nobel de Matemática. Também, entre muitos grandes gênios trabalhando nesse
notável instituto de matemática, o alagoano Fernando Condá deu mostras de como
a matemática pode frutificar em terras tão áridas, para não citar o saudoso
Professor Elon Lages Lima, também alagoano, que nos deixou em maio passado, não antes de firmar uma contribuição inestimável no papel de mentor e inspirador para a juventude
interessada na rainha das ciências.
Por outro lado, retrocedendo um pouco, em dezembro de 2016, ficamos
sabendo que o Brasil, na edição do Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes (PISA) de 2015, havia caído no ranking mundial de educação não só em
matemática, mas também em ciências e leitura. A prova foi aplicada para 23.141
alunos de 841 escolas no Brasil (https://g1.globo.com/educacao/noticia/brasil-cai-em-ranking-mundial-de-educacao-em-ciencias-leitura-e-matematica.ghtml ).
Os resultados foram considerados alarmantes, pois, entre as 6 categorias
em que os países são classificados, mais da metade dos estudantes brasileiros
obtiveram notas abaixo do nível básico – o nível 2 (gráfico ao lado). Particulamente
em matemática, mais de 70% dos estudantes estavam nesta faixa mais baixa de
conhecimento, o que era de se estranhar para um país laureado um ano antes pela
Medalha Fields.
Por sua vez, Sobral, uma cidade do interior do Ceará, vem ganhando notoriedade
nacional com as suas notas no Índice de Desenvolvimento da Educação Basica (Ideb),
um acompanhamento realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep), vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
O Ideb mostra que, das 100 melhores escolas do Brasil em 2016, nada mais que 77
estavam em território cearense. Entre os dez municípios com melhores notas no
país, quatro estavam no Ceará: Sobral (1o), Pires Ferreira (2º), deputado
Irapuan Pinheiro (3o) e Brejo Santo (6o).
(https://www20.opovo.com.br/app/opovo/cotidiano/2016/09/09/noticiasjornalcotidiano,3657675/77-das-100-melhores-escolas-do-pais-estao-no-ceara-mostra-ideb.shtml ).
Consultando os resultados no site do Inep (http://idebescola.inep.gov.br/ideb/consulta-publica ), podemos comprovar, bem como tomar
consciência do feito dessas localidades cearenses distantes de grandes centros.
A título de exemplo, as escolas fundamentais Emílio Sendim e Antônio Custódio,
em Sobral, conquistaram as impressionantes notas 9,8 e 9,7, respectivamente, no
Ideb 2015 para os anos iniciais do ensino fundamental (1º a 5º anos). São
valores de Ideb muito elevados, mesmo quando comparados às cidades mais ricas do país.
Esses resultados invejáveis foram alcançados com medidas já conhecidas, mas pouco
aplicadas nas escolas públicas pelo Brasil afora, tais como, o combate contra
faltas às aulas, a adoção de avaliações semanais de planejamento, a
implementação de tempo integral com reforço escolar no contra turno, o emprego
de segundo professor em sala de aula, entre outros. A pergunta que se faz é se
a Prova Brasil, que compõe o Ideb, é muito menos rigorosa do que o já citado exame
do Pisa. Em caso afirmativo, o Ideb, para as escolas brasileiras, teria apenas
valor relativo.
Seguindo nesta gangorra de notícias boas e ruins, nos últimos dias de
janeiro último, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
informou que mais de 2 milhões de crianças e adolescentes estavam fora da
escola, o equivalente a 5% da população nessa faixa etária. O Tribunal de
Contas da União (TCU) identificou que “quase metade dos municípios pesquisados
não toma nenhuma medida para acabar com a exclusão escolar” (https://g1.globo.com/educacao/noticia/auditoria-aponta-mais-de-2-milhoes-de-criancas-fora-das-salas-de-aula.ghtml).
Como conciliar essas duas últimas notícias, a não ser considerando que os
nossos resultados em educação ainda são casos localizados? Lembremos que, ainda
que Sobral e algumas outras cidades cearenses sejam bons exemplos, muitos outros
municípios, inclusive bem próximos a esta cidade bem avaliada, possuem números
bem ruins na área de educação, medidos pelo próprio Ideb, demonstrando uma
heterogeneidade de resultados dentro do território cearense. Essa conclusão
pode facilmente ser alcançada pesquisando-se no endereço do Inep (http://idebescola.inep.gov.br/ideb/consulta-publica ). Portanto, permanecem os desafios, mesmo no
estado considerado caso de sucesso.
Por fim, há poucos dias, Diego Lima, diretor de Escola Municipal Darcy
Ribeiro, em São José do Rio Preto em São Paulo, nos deu o orgulho de ele ter
sido selecionado entre os dez melhores professores do mundo para concorrer ao
prêmio Global Teacher Prize 2018. O louvável professor conseguiu reduzir a
evasão escolar e a violência em uma escola de um bairro carente e violento. Essa
grande conquista passaria por uma notícia totalmente alvissareira na área de
educação, não fossem os detalhes preocupantes do contexto de adversidade no
qual foi obtida, cenário comum em muitas escolas de regiões pobres do país (https://veja.abril.com.br/brasil/brasileiro-esta-entre-os-dez-melhores-professores-do-mundo/).
O balde de água fria final vem da notícia deprimente da eterna baixa
produtividade do trabalhador no Brasil, objetivo último que uma educação de
qualidade procura solucionar em qualquer país. Estudo da Fundação Getúlio
Vargas (FGV) mostrou na semana passada que, entre 68 países, o Brasil
encontrava-se na 50ª posição. Em média, um brasileiro gera US$ 16,80 por hora
trabalhada, quatro vezes menos que um trabalhador alemão ou americano (https://oglobo.globo.com/economia/brasil-aparece-na-lanterna-em-ranking-de-produtividade-22398977).
Os resultados díspares na educação brasileira trazidos acima demonstram outro
tipo de desigualdade tão gritante quanto a de renda e de riqueza: a educacional.
Talvez essa seja uma das mais perversas desigualdades por perpetuar a pobreza
de filhos de pais sem instrução que não contam com uma estrutura pública
adequada para romper o ciclo intergeracional de pobreza. Os bons resultados
narrados não contradizem, mas reforçam essa visão. A desigualdade educacional é
gerada pelas situações favoráveis de poucos em uma sociedade bastante desigual
em renda e riqueza, como o privilégio de estudar em colégios particulares de
excelência, ou também pelas iniciativas de sucesso isoladas, como a que temos
visto em Sobral. Uma visão mais pessimista diria que países como o Brasil tendem
a alcançar ainda assim alguns bons resultados, porque a escala da população é
suficientemente grande para que haja, mesmo com muita dificuldade, ao menos alguns
casos de sucesso. É uma mera questão estatística.
Pelo prisma mais otimista, alguns estudiosos afirmam que a desigualdade
é consequência natural do progresso. Os bons casos servem de incentivo para os
que ficam momentaneamente para trás. Como exemplo, o município de Gravatá em Pernambuco,
buscando elevar os seus resultados na educação, tem se espelhado na experiência
de Sobral (http://blogs.ne10.uol.com.br/jamildo/2018/02/14/gravata-aposta-em-revolucao-na-educacao-e-contrata-quadros-de-sobral-no-ceara/ ). O IMPA, como uma ilha de excelência na
matemática no país, não tem se omitido no seu papel transformador, pois há
muitos anos promove Olímpiadas de Matemática, inclusive dedicadas às escolas
públicas, desenvolvendo a curiosidade em matemática e impulsionando o progresso
de estudantes na área.
Educação é uma das unanimidades, quando se discute meios de se desenvolver
nações. Um relatório do Banco Mundial de 1993, citado por Martin Ravallion no
seu livro The Economics of Poverty,
afirmou que a universalização de qualidade do ensino primário é o principal
fator para o crescimento equitativo no Leste asiático, variando de 58% no Japão
a 87% na Tailândia. Tão somente com o fim desse comportamento bipolar na
educação brasileira, é que teremos a certeza que o Brasil já terá alcançado um
padrão de desenvolvimento desejado nessa área. É o que esperamos que ocorra o
mais rápido possível com uma priorização da educação pelos próximos governos.